Ano novo, vida nova, energias redobradas e sonhos recuperados.
Já as memórias, essas são as mesmas, sobretudo aquelas que nos marcam, e foram bastantes as que vivi longos destes anos com a Seleção Nacional Sub20 Femininos.
Desta feita trago tona o ano de 2012 e o Campeonato Europeu que realizamos em Debrecen, na Hungria. Foi um campeonato marcante, talvez mesmo dos que mais me recordo, por ter sido o primeiro em que competimos na Divisão A e porque… infelizmente o destino não quis que o vivêssemos da melhor forma, da única forma que eu conheço, a desportiva.
Com efeito, depois de uma preparação exemplar, onde conseguimos reunir aquele naipe de atletas que nos davam todas as garantias de um trabalho mais alto nível, chegamos Europeu prontos e dispostos dar 110%, de modo a honrar a nossa primeira participação nessa divisão.
Na manhã do primeiro jogo, ante a França, deparámos com o adoecimento súbito da Filipa Bernardeco, com sinais visíveis de intoxicação alimentar. O estado de espírito sofreu um enorme revés, pois percebemos desde logo que a situação era grave, ponto da atleta ter sido hospitalizada de urgência, e que a situação poderia ser também mais extensa do que pensávamos. Durante esse jogo perdemos a Laura Ferreira, com os mesmo sintomas.
Nessa noite, e num espaço de poucas horas, foram hospitalizadas mais quatro atletas: Brigitta Cismasiu, Joana Jesus, Maria João Andrade e Inês Faustino.
A explicação oficial, que só foi dada convenientemente pela organização depois de terminado o Europeu, era de que cerca de 40 elementos tinham contraído uma intoxicação alimentar, fruto da ingestão de alimentos contaminados por salmonelas durante o jantar de inauguração do campeonato.
Ou seja, hora do pequeno-almoço do segundo dia de competição, tínhamos seis atletas mesa: Joana Soeiro, Vitória Pacheco, Inês Pinto, Paula Couto, Jessica Almeida e Daniela Domingues. Num misto de consternação, pânico e raiva, vimo-nos na necessidade de tomar uma decisão. Ou abandonávamos e voltávamos para casa ou seguíamos em frente, mesmo se desconhecêssemos o dia seguinte.
A decisão foi unânime, sobretudo das atletas; continuaríamos em competição, em nome do País, em nome das colegas hospitalizadas e a pedido destas. E, claro, num desafio destino, mostrando a fibra de que éramos feitos e que nem assim iríamos chão.
Jogar um Europeu de nove jogos em doze dias já seria duro. Fazê-lo com apenas seis atletas e com temperaturas na ordem dos 40 graus era brutal, pelo que vivemos o nosso dia-dia na incerteza constante de não conseguirmos aguentar.
Ainda recuperamos duas das seis atletas hospitalizadas, mas isso foi insuficiente para evitarmos a descida. Conseguimos fazer, ainda assim, três vitórias e competir em quase todos os jogos (10 pontos com a Turquia, dois jogos com a Itália por menos de 10 pontos, etc.). Se acabámos por descer de divisão, fomos no entanto uns meritórios 14º classificados entre as 16 competidoras.
No intervalo do jogo da final e em pleno campo, a Europa disse “Bravo, Portugal”…
Retenho na memória os momentos de tristeza quando descemos de divisão, sobretudo nas atletas que nunca desistiram e encararam a descida como um insucesso, não obstante terem todas as justificações do mundo para dar. Foi inquestionavelmente um dos maiores marcos no respeito que nutro e cultivo pelas atletas portuguesas e mudou bastante a forma como me vejo no desporto e como me relaciono com aqueles que são a primeira essência de qualquer modalidade: o atleta.
A todos eles e elas rendo a minha homenagem, num momento em que iremos voltar mesmo país para competir em mais uma Divisão A e para uma vez mais recordar a estas doze heroínas, que cumprimos a nossa promessa de então: “Haveríamos de voltar Divisão A e desta vez para ficar”. E assim tem sido desde 2015.
por Eugénio Rodrigues (@eugenio_rodrigues_coach)