Extra-passe. Já devem ter ouvido a expressão. É algo que todos os treinadores de basquetebol utilizam muito nos dias de hoje, seja na NBA, na Euroliga ou no campeonato distrital de Sub16 Femininos de Viana do Castelo. O extra-passe não é só uma expressão da moda. É um ideal. As equipas que o conseguem fazer ficam mais perto do sucesso. O antigo poste dos San Antonio Spurs, Tim Duncan, dizia-o melhor que ninguém: “Good, better, best. Never let it rest. Until your good is better and your better is best”. Abdicar do bom para procurar o ótimo e, depois, abdicar do ótimo para procurar o excelente. E Timmy sabia do que falava.
Os Spurs habituaram-nos mal. Sobretudo os de 2013/14. Foram campeões, pois claro.
Maldito cisco no olho.
Mas o “Beautiful Game” não é um exclusivo dos Spurs. Antes dos texanos, houve uma equipa dos Boston Celtics, em 1986, que foi a primeira a levar ao extremo a partilha da bola e o altruísmo dos seus jogadores, liderados por um tal de Larry Bird. Foram campeões, pois claro.
A bola não cola
Hoje, este romantismo do passe adicional parece ter desaparecido, mas há uma equipa que apresenta números de franzir o sobrolho. Os Golden State Warriors lideraram todos os rankings no que ao passe diz respeito. Foram os melhores da época nas assistências, com uma média fabulosa de 30.4 por jogo, bem acima da equipa mais próxima, os Celtics (25.2). Foi a primeira vez desde os “Showtime” Lakers de 1984/85 que uma equipa ultrapassa a marca das trinta assistências por partida.
No entanto, a formação de Oakland não se ficou por aqui. Foi, igualmente, líder nos passes que antecedem as assistências, as chamadas secondary assists (9.6), e nos passes que terminam em lançamento, falta ou turnover, as potential assists (54.4), também muito acima dos mesmos Celtics em ambos os capítulos (9.6 e 49.5, respetivamente).
Bons a passar e a lançar
Bons a passar a bola? Check. E as eficácias de lançamento também têm beneficiado desse estilo? Não há dúvidas. Líderes em percentagem de lançamentos de campo (49.5%), Effective Field Goal Percentage (56.3%) e True Shooting Percentage (59.7%), os Warriors têm rebentado todas as escalas.
Quanto aos jogadores, também eles fizeram, cada um à sua medida, temporadas acima da média. No cinco inicial, os “reforços” Kevin Durant e Zaza Pachulia assinaram épocas de carreira em termos de True Shooting % (65.1% para KD e 58.8% para Zaza). Os outros três titulares baixaram ligeiramente em relação à última época, mas apresentam números muito interessantes: 62.4% de Steph Curry, 59.2% de Klay Thompson e 52.2% de Draymond Green. E o mesmo se pode dizer dos suplentes Andre Iguodala (62.4%), Shaun Livingston (56.8%), David West (57.1%), Ian Clark (57.5%) e JaVale McGee (64.2%).
Passar a bola faz duas pessoas felizes
O lançamento é o fundamento mais importante do basquetebol, porque é aquilo que permite ganhar jogos. Mas o passe é o fundamento que simboliza tudo o que o desporto coletivo deve representar: união, espírito de equipa, trabalho conjunto em prol de um objetivo comum. Quando, em fevereiro deste ano, perguntaram a Nikola Jokic, poste dos Denver Nuggets, se preferia marcar pontos ou fazer assistências, o sérvio não hesitou em recuperar as palavras de Earvin “Magic” Johnson: “Passar a bola faz duas pessoas felizes. Marcar faz apenas uma pessoa feliz”.
Ninguém apelida o que os Warriors fazem de “Beautiful Game”. As narrativas na NBA levam a discussão para os ódios que Kevin Durant gerou com a mudança de Oklahoma City para a Bay Area, as dúvidas sobre quando é que Draymond Green vai voltar a ser suspenso ou qual foi o episódio digno dos melhores programas de apanhados de JaVale McGee. Mas, narrativas à parte, se nos focarmos apenas no que acontece dentro das quatro linhas, vemos algo muito especial. É uma espécie de “Beautiful Game” dos Warriors de 2016/17. A bola não cola. Vão ser campeões, pois claro.
Artigo originalmente publicado no SAPO24