Mesa de cabeceira #7 - Assistência perfeita
"Feel the Magic — Ticha Penicheiro" estreou esta quinta-feira, no Tribeca Festival Lisboa.
Ia para o Convento do Beato a pensar que ia ver uma estreia. Não imaginava que ia passar a noite com lágrimas nos olhos. Não levei lenços: erro de amador. Mais do que basquetebol, nestes documentários interessam-me as pessoas, as relações, os fios invisíveis que seguram uma vida. E Feel the Magic — Ticha Penicheiro é exactamente isso: o jogo como pretexto, a pessoa no centro. E é casa, rua, Figueira da Foz, Old Dominion, Sacramento; é lágrimas, lesões, vitórias e, sobretudo, gente — pais, irmão, amigas, treinadores, jogadoras que ainda hoje dizem “It was never about her”.
Há uma frase da Ticha que me ficou: “o basquete era aquilo que eu fiz, mas não é quem eu sou”. Se o que ela fez já é história, o que ela é não cabe num ecrã, mesmo que gigante. E se, com a bola nas mãos, foi das melhores de sempre, que diz isso sobre o resto? Agente, mentora, amiga, referência — alguém que transforma talento em possibilidades e possibilidades em legado. No basquetebol diz-se: “um cesto faz uma pessoa feliz; uma assistência faz duas pessoas felizes”. A Ticha construiu a vida toda a preferir fazer duas: primeiro a servir dentro de campo, agora a multiplicar fora dele.
O olhar do realizador André Braz faz o resto: sensibilidade, bom gosto, e o tempo certo para os silêncios trabalharem. Entre tantos depoimentos, o do pai de Ticha, João Penicheiro, comove de forma diferente: poucas palavras, muito orgulho, pausas que contam uma vida. Como pai, emocionei-me. E tive a certeza de que a pessoa que a Ticha mais queria ali, ao lado da mãe, do irmão e do sobrinho, era ele. A forma como o filme fixa o brilho nos olhos do patriarca Penicheiro deixa à Ticha uma memória que fica para sempre.
Saí do Tribeca Festival Lisboa com a sensação de ter visto um filme que fala pouco de basquetebol e muito de carácter, família e pertença. De trabalhar muito, sonhar alto e, quando é preciso, saber parar para respirar. É cinema que recebe e devolve. É — ironia das ironias — a assistência perfeita.
Recomendação da semana, de coração cheio: vejam Feel the Magic — Ticha Penicheiro. E, aviso amigo, tenham lenços à mão.
📚 Dobra no canto
Quando a NBA abre a época na capa do The New York Times, raramente é por boas razões. No Silver Bulletin, Nate Silver assina a explicação mais lúcida do escândalo de apostas: 43 notas que desmontam o mecanismo — linhas que mexem antes dos comunicados, o prémio da informação privilegiada, a vulnerabilidade estrutural dos player props. Para quem não aposta, é um guia sobre integridade competitiva e transparência; para quem aposta, um espelho incómodo: limites para sharps, tapete vermelho para whales, e um cardápio de apostas tão amplo quanto curto de prudência.
Silver não se esconde: assume-se apostador, reconhece onde errou, e propõe medidas concretas (anúncio antecipado de ausências, limites nos props, apostas condicionadas à participação de estrelas). Bónus final: a acusação paralela sobre poker e por que mesas privadas com rake e baralhos “afinados” são receita para vigarices. Leitura essencial.
Outras sugestões de leitura:
☕ Conversa de café
Na última edição do podcast Bola ao Ar, dissecámos o primeiro duplo-duplo da época de Neemias Queta, as equipas ainda invictas na liga, a nossa All-NBA First Week Team e o arranque de Tyrese Maxey.
E no primeiro episódio da semana, fizemos overreactions: Victor Wembanyama em modo MVP, Austin Reaves a ferver, vibes dos rookies… e até as eleições no Benfica.
No podcast Afunda de 3, olhamos para a primeira semana da NBA: Miami Heat no turbo, Dallas Mavericks sem espaço, Wemby assustador e Jonathan Kuminga a convencer.
🚨 Buzzer beater
Nikola Jokić é fã de Peaky Blinders.




