Dinis Amaral: "A idade não é um posto"
Do ensino do professor Jorge Araújo às conversas com Tuomas Iisalo, o treinador português fala do papel de “principal” no Évreux, a aprendizagem no Galomar e a NBA no horizonte.
Aos 28 anos, Dinis Amaral inicia a segunda época como adjunto do ALM Évreux, na ProB francesa, depois de concluir o FECC, a maior certificação da Europa. Em miúdo, saía da secretaria da Ovarense para o gabinete do professor Jorge Araújo para ver cassetes, hoje troca ideias com Tuomas Iisalo sobre filosofia de jogo.
Em entrevista exclusiva à Federação Portuguesa de Basquetebol, o técnico fala da aprendizagem do ano histórico no Galomar, as diferenças estruturais que encontrou em França e da ambição de competir nas provas europeias a curto prazo e, um dia, chegar à NBA.
“Quando cheguei, só falava inglês; francês, mais ou menos. Perguntei: ‘Como é que vou fazer aqui?’ E disseram: ‘Não te preocupes, falamos inglês para ti’. Mas na primeira reunião com os dirigentes tudo foi em francês. Tive de me desenrascar: Duolingo, novelas francesas, tudo para melhorar. Nos treinos, ter o Anthony a falar português comigo foi espetacular. Estás preso a uma língua estrangeira, mas quando tens alguém que te percebe verdadeiramente na tua, é diferente. Dá-te uma naturalidade na voz: “Let’s go, guys… Tony, foda-se, corre, caralho!” É diferente. No fim da época já tinha muitos jogadores a falar português; as asneiras que digo em português eles já as sabiam.”
“A minha mãe trabalhava na secretaria da Ovarense, era administrativa, e eu, em vez de ir para o infantário, preferia ir para o pavilhão com ela, no Raimundo Rodrigues. Nos anos 2000 eu tinha 3 ou 4 anos e o treinador da Ovarense era o professor Jorge Araújo. Ele estava sempre no pavilhão e, quando passava pela secretaria e me via, dizia: ‘O que estás aqui a fazer? Anda comigo’. Levava-me para o gabinete, punha as cassetes dos jogos para fazer scouting e ficávamos os dois a ver. Eu tinha quatro anos, não percebia nada de basquete, mas via os vídeos com ele a explicar: ‘Olha aqui, eles fazem isto, fazem aquilo’. A minha mãe diz que ele já sabia que eu ia ser treinador.“
“Sempre que entro num pavilhão, seja para dar um treino, um clinic ou uma palestra, para além de ser novo sou pequeno. A malta diz: ‘Ah, és tu? Pensava que eras o fisioterapeuta’. Só quando falas e mostras aquilo que construíste é que ganhas respeito. No primeiro ano no Galomar, tinha 25 anos e o meu capitão era o Edson Rosário, que tinha 42 anos — idade quase para ser meu pai. A primeira vez que me apertou a mão senti que pensava: ‘Mandam para aqui um puto…’ Posso dizer que foi o primeiro, durante os treinos, a defender-me em qualquer momento de conflito, a fazer respeitar e cumprir o que eu queria. Porque a honestidade transcende a experiência. Se fores honesto e profissional, eles seguem-te.”
“Ao visitar o Philippe (da Silva), vi que iam jogar contra o Paris Basket e tive acesso ao scouting. Investi muito a estudar e decidi enviar uma mensagem ao Tuomas Iisalo no LinkedIn. Fiz-lhe uma pergunta sobre o ataque orientado ao TJ Shorts, se tinha alternativa quando ele não estava. Pensei que não ia responder. Mas ele respondeu com um vídeo dos White Stripes, em que o vocalista explicava que, quando queria fazer uma música, fechava-se com uma palheta, uma caneta e uma folha e só saía quando encontrava a solução. E acrescentou: ‘Mais do que procurar uma alternativa, procuras sempre a cura para o teu vírus e vais moldando a tua filosofia’. Para mim, um treinador que estava a lutar pela EuroCup perder tempo a responder a alguém de Portugal mostra o tipo de pessoa que é. Identifico-me muito com ele.“