Clara Silva "vai ser uma das melhores jogadoras do basquetebol universitário"
Treinador garante que a poste portuguesa de 19 anos está apenas a "arranhar a superfície". TCU invicto (12-0) e no top-10 nacional começa a dar-lhe razão.
Mark Campbell não é treinador de eufemismos. Quando o técnico da universidade de TCU foi questionado sobre a portuguesa Clara Silva após a vitória por 109-54 sobre Arkansas-Pine Bluff, na terça-feira, não hesitou:
“A (Clara) Silva está apenas a arranhar a superfície do seu teto. Nem sequer está perto do que vai parecer daqui a dois anos e meio. Vão ver uma das melhores jogadoras do basquetebol universitário.”
A declaração seria ousadia se não estivesse ancorada em factos. A poste de 19 anos e 1,98 metros está a construir uma época sophomore que valida a aposta de Campbell e justifica a transferência de Kentucky para Fort Worth. Clara Silva chegou a TCU como solução para o jogo interior depois de uma época de estreia discreta nas Wildcats. Quatro meses depois, com a equipa invicta (12-0) e classificada no 9.º lugar da AP Poll e no 7.º do Coaches Poll, é peça incontornável de um projeto que se transformou em candidato nacional.
Duplo-duplo com 100% de eficácia
Os números recentes contam a história. No jogo contra Jacksonville, a 14 de dezembro, Clara assinou o melhor registo ofensivo da carreira universitária: 21 pontos, com 10/10 em lançamentos de campo, e 10 ressaltos, o seu segundo duplo-duplo da temporada. Contra Arkansas-Pine Bluff, voltou a contribuir com 14 pontos e 7 ressaltos em 23 minutos.
No acumulado da época, a internacional portuguesa regista médias de 9.7 pontos e 7.7 ressaltos — lidera a equipa nas tabelas — em pouco mais de 21 minutos por jogo. A eficácia ofensiva de 64.2% do campo coloca-a entre as postes mais eficientes da NCAA, e os 1.6 desarmes de lançamento por jogo fazem dela uma das melhores rim protectors da conferência Big 12.
Mas o impacto de Clara Silva não está apenas na folha estatística. Está na forma como ancora a defesa de uma equipa que lidera a NCAA em pontos sofridos — apenas 48.5 por jogo — e limita os adversários a 29% de eficácia nos lançamentos de campo. TCU é a equipa mais alta da divisão, com uma média de 1,88 metros, e Clara é uma das razões pelas quais o sistema de Mark Campbell — baseado em pick-and-roll, pressão defensiva e transições rápidas — funciona ao mais alto nível.
O big three de TCU: Miles, Suárez e Silva
A construção do plantel de TCU para 2025-26 foi cirúrgica. Campbell perdeu as estrelas Hailey Van Lith e Sedona Prince e foi ao transfer portal buscar talento veterano para manter o nível competitivo. A aposta maior foi Olivia Miles, considerada a melhor base do basquetebol universitário, que abdicou do draft da WNBA para jogar uma última época no college. A segunda foi Marta Suárez, extremo/poste espanhola de 1,90 metros que chegou de Cal Berkeley com currículo comprovado.
Juntas, Miles e Suárez formam o motor ofensivo das Horned Frogs. Miles lidera a equipa em assistências (7.9 por jogo) e é a segunda melhor marcadora (18.1 pontos). Suárez comanda o ataque com 18.7 pontos de média, 6.4 ressaltos e eficácias brutais: 55.4% de campo e 44.3% de triplos. Foi eleita Big 12 Player of the Week e marcou 26 pontos na vitória sobre NC State, então classificada no 10.º lugar nacional.
Clara Silva completa o trio. Se Miles distribui e Suárez marca, Clara ancora. É a rim runner que finaliza após combinação com Miles, a ressaltadora que garante segundas oportunidades, a screener que liberta espaço para os lançadores exteriores e a presença defensiva que permite à equipa pressionar no perímetro sem medo de ser castigada na área pintada.
Sabreena Merchant, analista do The Athletic, descreveu o funcionamento do sistema numa análise recente sobre as equipas do top-10 nacional:
“Olivia Miles e Clara Silva são fulcrais neste sistema. São as transferências que permitiram às Horned Frogs sequer implementá-lo. O que as torna de competentes a excelentes são ameaças ofensivas adicionais que criam os seus próprios lançamentos quando os adversários tiram o pão e a manteiga no meio do campo.”
Merchant destacou ainda a capacidade de Suárez para criar o seu próprio lançamento em isolamento, aliviando a pressão sobre Miles e Silva quando as defesas adversárias ajustam. A performance da espanhola contra NC State — com vários buzzer-beaters a fechar quartos e jumpers decisivos em momentos-chave — foi exemplo disso mesmo.
Campbell vê em Clara a próxima estrela do programa
A declaração do treinador não foi casual. Campbell, que transformou TCU numa potência emergente da NCAA em apenas três épocas, tem histórico comprovado no desenvolvimento de jogadoras. No ano passado, levou a equipa ao Elite Eight com Van Lith como principal estrela. Este ano, montou um plantel recheado de talento veterano com Miles e Suárez.
Nesse contexto, reservar esse tipo de elogio público a uma sophomore de 19 anos não é retórica motivacional, mas sim uma aposta estratégica. Campbell sabe que Miles e Suárez, as duas principais referências ofensivas da equipa, são seniors e vão sair no final da época. Clara Silva, pelo contrário, ainda tem dois anos e meio de elegibilidade pela frente.
De Kentucky a TCU: a escolha certa no momento certo
A época de estreia na NCAA não correu como esperado. Depois de brilhar no Unicaja Málaga e assinar por Kentucky, uma das powerhouses históricas do basquetebol universitário, Clara viu os minutos escassearem à medida que a época avançava. Começou bem — foi nomeada Freshman of the Week logo na primeira semana —, mas perdeu espaço na rotação para Clara Strack, que viria a ser eleita Defensive Player of the Year da conferência SEC.
As médias de 4.0 pontos e 2.6 ressaltos em pouco mais de 12 minutos por jogo não refletiam o potencial demonstrado em Espanha e nas seleções jovens. Quando entrou no transfer portal no final da época, Clara tinha critérios bem definidos, aconselhada pela lenda da WNBA, e agora sua agente, Ticha Penicheiro: queria um treinador com histórico comprovado de desenvolvimento de jogadoras, uma equipa competitiva e um ambiente que lhe desse confiança.
TCU reunia todas as condições. Mark Campbell tinha transformado o programa de último classificado da conferência para candidato ao top-10 nacional em apenas duas épocas. A filosofia de jogo, baseada em ritmo alto e espaçamento, favorecia postes móveis e com capacidade de decisão rápida. E a adição de Olivia Miles garantia que Clara iria jogar com a melhor distribuidora do país.
TCU invicto e calendário exigente à frente
Com 12 vitórias em 12 jogos, TCU prepara-se para iniciar a fase de conferência da Big 12 no sábado, dia 21, frente a Kansas State. O calendário de janeiro inclui 16 jogos, viagens sucessivas e pouco tempo de treino. Será o teste definitivo à profundidade do plantel e à capacidade de Clara Silva manter este nível quando o cansaço se acumular e o scouting adversário for mais específico.
A equipa de Mark Campbell tem tudo para ser uma das surpresas da época. Lidera a NCAA em defesa e conta com duas das melhores jogadoras do país em Olivia Miles e Marta Suárez. Mas o sucesso prolongado dependerá, em grande medida, da capacidade do jogo interior se manter competitivo quando o torneio da NCAA chegar em março.
É aí que entra a aposta de Campbell em Clara Silva. O treinador vê nela não apenas a solução para esta época, mas a peça central do projeto para os próximos anos. Se a poste lusa continuar esta trajetória de crescimento, o basquetebol universitário norte-americano vai ter de aprender a pronunciar o seu nome mais cedo do que mais tarde.





