Há uma portuguesa a brilhar na NCAA. Inês Vieira, base de terceiro ano da universidade de Utah, bateu todos os recordes pessoais ao serviço das Utes, esta época, e chegou a ocupar o 2.º lugar do ranking de total de assistências, apenas atrás de Caitlin Clark, com 61 passes para cesto nos primeiros oito jogos.
Nesta altura, com outras atletas já com mais um ou dois jogos realizados, Inês Vieira é 10.ª nos rankings de total de assistências e de assist/turnover ratio, e 4.ª na média de assistências por jogo (7.6), entre as mais de 5 mil atletas das 351 universidades da Division 1 da NCAA.
No torneio Great Alaska Shootout, nos primeiros jogos oficiais da temporada, Inês somou médias de 15.0 pontos e 10.5 assistências, com eficácias de 83.3% nos lançamentos de campo, e 100% nos triplos e nos lances livres. Foi naturalmente eleita para a All-Tournament Team do torneio.
Fomos ver os jogos de Utah deste arranque de temporada 2023-24 para perceber de que forma a internacional Sub20 está a criar vantagens para a sua equipa, merecendo elogios de treinadores, colegas de equipa e imprensa.
A velocidade de Inês permite a Utah procurar reacções rápidas à conquista da posse de bola, seja após ressalto, turnover das adversárias ou cesto sofrido. A base lusa acelera o jogo, identifica as vantagens em campo aberto e serve as colegas com passes milimétricos.
Se o jogo abrandar e Utah optar pelo 5x5 em meio campo, Inês é uma base que sabe colocar a equipa a jogar no sistema ofensivo das Utes, utilizando toda a sua técnica individual, a capacidade de passe com ambas as mãos e uma tomada de decisão acima da média.
(A precisão dos dois lobs no final do vídeo é um pormenor delicioso)
Sempre foi uma característica do jogo da internacional portuguesa, mas agora que está mais confortável no estilo do campeonato universitário dos EUA, Inês faz da tomada de decisão e passe após penetração [drive and kick] uma das principais armas do ataque das Utes.
Para além do perfil que os vídeos acima ajudam a identificar, há pormenores no jogo de Inês Vieira, em jogadas isoladas, que comprovam um skill que define a base lusa e que nem sempre tem tradução na folha estatística: Q.I. basquetebolístico.
No vídeo em baixo, vemos uma simples assistência para a jogadora interiora. Mas o que salta à vista é a combinação “finta de arranque para a direita + drible para a esquerda” que obriga a defensora a ajustar a posição. Ora, esse ajuste abre o ângulo necessário para o passe de entrada.
Pormenor incrível no próximo vídeo, frente a uma zona 2x3. Ao receber a bola, Inês vê o corte da colega do lado contrário (#20) e, percebendo que essa colega vai dar continuidade ao corte e recolocar-se no perímetro, dribla para cima, arrastando a defensora da linha de trás da zona para os 45º, o que dá espaço e tempo para a colega que se recolocou no canto para receber e lançar.
Penetração pela linha final do lado direito do ataque e Inês, do lado fraco, trabalha bem sem bola para oferecer a linha de passe no canto. Após recepção, e mesmo tendo tempo e espaço para “atirar”, prefere fazer o passe extra. Abdica do seu bom lançamento para dar à colega um excelente lançamento. Decisão altruísta e que revela liderança.
Aqui, Inês serve a poste e estrela da equipa, Alissa Pili, que chama a atenção da defesa de BYU com a sua gravidade. Em queda, Alissa devolve o passe a Inês, que percebe que todas as defensoras estão bem abaixo do prolongamento da linha de lance livre e, em vez de passar para a primeira linha de passe, opta por servir a colega do topo, com a mão não dominante (direita), o que impossibilita a rotação de chegar a tempo de contestar o lançamento. Decisão e execução perfeitas.
Nesta situação, vê a bola perdida no pintado e conquista o ressalto ofensivo. Quando a maioria das bases sairia do perímetro e reiniciaria o ataque, Inês sabe que quatro defensoras estavam na área restrictiva e, por isso, a linha de três pontos está desprotegida. A portuguesa levanta a cabeça à procura da “atiradora”, interrompe o drible e soma mais uma assistência.
Nova situação a partir de um ressalto ofensivo, desta vez após lançamento falhado da própria Inês. O que faz a diferença é a forma como olha por cima do ombro ainda no ar, durante o regresso ao solo após garantir o ressalto. Identifica onde está a colega nos três pontos e executa o passe assim que os pés tocam no piso, com uma rotação de anca e técnica de passe extraordinárias.
Ainda antes de passar a linha do meio campo, Inês já identificou o mismatch da colega Alissa Pili perto do cesto. Decide abrandar o ritmo, para esperar pela decisão da defensora de Pili. Ao perceber que a defensora da poste tenta saltar para a frente, a base faz um lob perfeito para dois pontos fáceis.
E até numa reposição de linha lateral fica evidente o Q.I. basquetebolístico de Inês Vieira. Com as cinco defensoras de costas para a linha final, a base portuguesa espera que o corte da colega (#22) obrigue a defensora que está mais longe da bola a mexer a cabeça para decidir o momento exacto do passe para o canto oposto, para o triplo.
Com sete vitórias nos primeiros oito jogos, as Utes são a 11.ª equipa do ranking da NCAA, a nível nacional, mas perderam a base Gianna Kneepkens para o que resta da temporada com uma lesão num pé sofrida frente a BYU. A portuguesa Inês Vieira tem sido um dos pilares de Utah e o seu Q.I. basquetebolístico será determinante para o sucesso.
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